
Comentários a disposições especifícas
da Proposta de Lei nº. 97/VII, que estabelece o Novo Regime Jurídico-Legal
em Matéria de Asilo e de Refugiados
I. Sumário dos comentários do ACNUR
1. Exposição de Motivos
Na Exposição de Motivos, no segundo parágrafo
da página nº. 2, foi omitida a referência ao recurso
da decisão final da reapreciação do Comissariado Nacional
para os Refugiados, para o Tribunal Administrativo de Círculo (TAC),
que não tem efeitos supensivos.
2. Artigo 1º., nº. 2
Seria desejável que existisse, neste artigo, uma referência
à Convenção de Genebra de 1951 e ao Protocolo de Nova
Iorque, da seguinte forma:
"2. Têm ainda direito à concessão de asilo os estrangeiros
e apátridas que, receando com fundamento ser perseguidos em virtude
da raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas
ou integração em certo grupo social, não possam ou,
em virtude desse receio, não queiram voltar ao Estado da sua nacionalidade
ou da sua residência habitual, nos termos da Convenção
de Genebra de 1951 e do Protocolo de Nova Iorque de 1967."
3. Artigo 2º.
3.1 Em relação à epígrafe deste
artigo sugere-se que seja alterada para:
"Efeitos do Estatuto de Refugiado"
3.2 A redacção do texto é incorrecta. A concessão
de asilo não torna uma pessoa refugiada. Pelo contrário,
o facto de uma pessoa ser refugiado(a) torna-o(a) elegível ou com
direito a asilo. Redacção sugerida:
"As pessoas a quem foi concedido asilo estarão sujeitas às
disposições da presente lei, e serão tratadas de acordo
com os tratados internacionais ou acordos relativos a refugiados, dos quais
Portugal é ou será parte, em particular a Convenção
das Nações Unidas de 1951 relativa ao Estatuto de Refugiado
e ao seu Protocolo de 1967".
4. Artigo 4º., nº. 2
O Estatuto de Refugiado deve também ser alargado a outros
irmãos do requerente de asilo, ainda menores. De outro modo,
a família nuclear poderá ser desintegrada.
5. Artigo 8º., nº. 4
Dever-se-ia incluir no âmbito das competências da Divisão
de Refugiados do SEF a emissão da Autorização
de Residência, por forma a tornar este processo mais célere,
nos seguintes termos:
"Compete à Divisão de Refugiados do Serviço
de Estrangeiros e Fronteiras emitir o documentos comprovativo de residência,
a atribuir nos termos dos números 2 e 3 do presente artigo."
6. Artigo 10º.
Neste artigo dever-se-ia fazer referência ao artigo 1º.
da Proposta de Lei, uma vez que a definição é mais
abrangente que a definição da Convenção de
Genebra e do Protocolo de Nova Iorque (no seguimento da nossa proposta
para o artigo 1º., onde se propõe a introdução
da referência à Convenção de 1951 e ao Protocolo
de 1967. Assim, propomos:
"Para os efeitos da presente lei, entende-se por pedido de asilo
o requerimento pelo qual um estrangeiro solicita a um Estado a protecção
nos termos do Artigo 1º. da presente Lei."
7. Artigo 11º., nº.1
Neste número prevê-se a possibilidade de apresentação
do pedido a qualquer autoridade policial. Sugere-se que se adopte
o que estava previsto da versão anterior da Proposta, que era apresentação
do pedido a qualquer autoridade.
8. Artigo 11º., nº. 4
O ACNUR/CPR, tal como acontece no Regime Especial de Pedidos apresentados
nos Postos de Fronteiras, deveriam ser informados de que foi apresentado
um pedido de asilo, pelo que sugerimos a seguinte redacção
para o nº. 4 deste artigo:
"O pedido é remetido ao SEF, que o deverá comunicar
imediatamente ao representante do ACNUR e ao Conselho Português para
os Refugiados".
9. Artigo 11º., nº. 5
Para o nº. 5 propõe-se a seguinte redacção:
"O SEF deve notificar o requerente de asilo para prestar declarações
no prazo de 5 dias."
10. Artigo 11º., nº. 6
O nº. 6 deverá ter a mesma redacção do nº.
5 da Proposta de Lei.
11. Artigo 13, nº. 1
Sugere-se a seguinte redacção para o corpo deste artigo:
"1. O pedido é considerado inadmissível se,
após instrução e análise sumárias, se
verificarem algumas das causas previstas no artigo 3º. ou nas
alíneas seguintes: ...".
12. Artigo 13º., nº. 1, b)
Sugere-se a substituição da expressão "ou país
terceiro de acolhimento" pela expressão "ou por um país
terceiro de acolhimento que concorde em readmitir o requerente de asilo
no seu território e, se necessário, analisar o pedido".
13. Artigo 13º., nº. 2, a)
Para a redacção desta alínea sugere-se o seguinte
texto:
"Baseie e fundamente o seu pedido em provas que emanam de
documentos falsos ou falsificados e quando, interrogado sobre os mesmos,
tiver declarado a sua autenticidade."
14. Artigo 13º., nº. 2, b) e c)
Estas alíneas não está de acordo com o parágrafo
199 do Manual de Procedimentos do ACNUR, pelo que devem ser retiradas.
As falsas declarações iniciais podem ser explicadas e justificadas
pelo medo e pela pressão psicológica em que o(a) requerente
de asilo se encontra.
15. Artigo 14º., nº. 3
Considera-se que seria desejável que o Director do SEF, antes
de proferir ume decisão de recusa ou admissão do pedido,
ouvisse o ACNUR/CPR se estes o entendessem conveniente, pelo que sugerimos
a seguinte redacção do nº. 3 do presente artigo:
"Para efeitos de decisão serão ouvidos o representante
do ACNUR e o Conselho Português para os Refugiados, se o considerarem
necessário, aos quais será dado imediato conhecimento
da decisão final".
16. Artigo 15, nº. 1
Em relação a este artigo sugere-se a seguinte alternativa:
"A decisão de recusa do pedido é notificada ao requerente
com a menção de que deve abandonar o País no prazo
de 15 dias, sob pena de expulsão.
A expressão expulsão imediata não dá ao requerente
de asilo uma garantia suficiente de que não será expulso
antes de chegar à fase de interposição do recurso,
uma vez que o recurso para o Tribunal Administrativo de Círculo
não tem efeito suspensivo.
Em relação ao prazo para expulsão parece haver
um retrocesso injustificável em relação à Lei
70/93, que já previa 15 dias.
17. Artigo 16º., nº. 2
Neste artigo propõe-se a seguinte redacção:
"No prazo de 48 horas, a contar da data da recepção do
pedido de reapreciação ou da entrevista ao requerente, o
Comissário Nacional para os Refugiados profere a decisão
final, da qual cabe recurso, a interpor no prazo de 8 dias, para o Tribunal
Administrativo de Círculo, cuja decisão deve ser proferida
com carácter de urgência".
18. Artigos 17º. a 20º.
Em relação ao regime proposto para este processo especial
para os pedidos apresentados nos postos de fronteira, deve-se tentar fazer
uma oposição de princípio, pois introduz um tratamento
desigual em relação a todos os outros requerentes de asilo:
são-lhes impostos prazos muito mais curtos; é obrigado
a permanecer na zona internacional do porto ou aeroporto por um período
necessariamente superior a 48 horas (prazo máximo permitido
pela Constituição sem que a detenção seja decretada
por um juiz).
19. Artigo 36º., i)
Deve especificar-se que as disposições do artigo 32 da
Convenção relativa a Refugiados, de 1951, se aplica à
expulsão de uma beneficiário de asilo. Pelo que, sugerimos
a seguinte redacção:
"A decisão de expulsão do asilado proferida pelo
tribunal competente, sem prejuízo do artigo 32 da Convenção
de Genebra de 1951."
20. Artigo 37º., nº. 1
Sugere-se a substituição da expressão "...anterior
é causa de expulsão...", pela expressão "...anterior
pode ser causa de expulsão...". A cessação do
do estatuto de refugiado não deve significar necessariamente que
o refugiado será expulso do país, no caso de ter um estatuto
determinado e de estar integrado na sociedade.
21. Artigo 60º.
A comunicação ao ACNUR e ao CPR não é considerada
desejável, pelo que se sugere que a redacção deste
artigo seja alterada nos seguintes termos:
"1. As notificações ao requerente são feitas
pessoalmente ou através de carta registada, com aviso de recepção,
a enviar para a sua última morada conhecida, com cópia,
para conhecimento, ao Conselho Português para os Refugiados.
2. No caso de a carta ser devolvida, considera-se a notificação
feita se o requerente não comparecer no Serviço de Estrangeiros
e Fronteiras no prazo de 20 dias a contar da data da referida devolução".
II. Comentários adicionais do ACNUR
-
A exclusão imposta no Artigo 3º. não pode ser analisada
na fase de admissibilidade, uma vez que requer uma análise profunda
e cuidadosa de todas as circunstâncias e, consequentemente, devem
ser analisadas no contexto de um procedimento de determinação
completo, depois do exame às cláusulas de inclusão.
A remissão que é feita no corpo do artigo 13º. para
o artigo 3º. deve ser retirada. Pela mesma razão, a alínea
c) do artigo 13º. deve ser retirada.
-
O prazo de 5 dias estabelecido no artigo 23º., nº. 2 parece ser
demasiadamente curto. Sugere-se que seja, no mínimo, de 10 dias,
que corresponde ao prazo imposto no nº. 1 do mesmo artigo, para a
proposta do CNR.
-
A expressão "...para o efeito de procurar asilo ou regressar àquele
que já lho tenha concedido.", do artigo 25º., nº. 1, é
não só desnecessária como incorrecta. Uma pessoa cujo
pedido de asilo tenha sido recusado pode decidir regressar para o seu próprio
país ou pode dirigir-se para qualquer outro país, sem, necessariamente,
ter de aí pedir asilo. Sugeria que aquela expressão fosse
substituída neste sentido "...para o efeito de procurar outro país
para onde ir."
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A decisão sobre reinstalação requer uma análise
cuidadosa da informação, das circunstâncias do requerente,
das possibilidades de integração, etc.. O período
de 24 horas para elaborar a recomendação, imposto no artigo
27º., é extremamente curto. Claro que, em casos urgentes de
segurança, pode exigir-se uma decisão rápida, mas
na maioria dos casos é necessária uma análise mais
completa e longa do processo.
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O artigo 36º., alínea d) não está de acordo com
as cláusulas de cessação da Convenção
de Genebra de 1951. O texto deveria ser o seguinte: "Pedido e obtenção,
pelo beneficiário de asilo..."
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Artigo 59º. Como pode uma decisão ser final se está
ainda pendente um recurso?
31 de Agosto de 1997
1 Alto Comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados.