Moçambique
ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA*
Lei nº. 21/91
de 31 de Dezembro
Através do competente instrumento, a República de Moçambique
aderiu em 22 de Outubro de 1983 à Convenção Relativa
ao estatuto, de 28 de Julho de 1951, formulando, na altura, as suas reservas,
nos termos do artigo 42 da referida Convenção.
O Estado Moçambicano pelas Resoluções nº.
11/88 e 12/88, de 25 de Agosto, ratificou a Convenção da
Organização da Unidade Africana, relativa a aspectos específicos
dos problemas dos refugiados em África, de 10 de Setembro de 1969
e o Protocolo Adicional à Convenção de Genebra sobre
o Estatuto do Refugiado, de 31 de Janeiro de 1967.
Para a correcta implementação das Convenções
e Protocolo referidos, impõe-se proceder a consagração
dos mecanismos processuais adequados que nortearão todo o formalismo
a que devem obedecer os pedidos de estatuto de refugiado pelos respectivos
interessados. A consagração legal destes mecanismos traduz
uma actividade necessariamente complementar dos conteúdos das referidas
Convenções de modo a assegurar-se não só a
legalidade da aplicação dos citados instrumentos bem como
permitir-se a materialização do respeito da mesma legalidade
relativamente aos pedidos de asilo, deste a apresentação
do competente pedido até a sua decisão final, tendo como
objectivo último materializar o princípio constitucional
do respeito e defesa dos direitos humanos.
Nestes termos, ao abrigo do nº. 1 do artigo 135 da Constituição,
a Assembleia da República determina:
ARTIGO 1
(Conceito de refugiado)
-
Considera-se refugiado todo aquele que:
-
tenha um fundado receio de ser perseguido por causa da sua raça,
religião, nacionalidade, filiação em determinado grupo
social ou suas opiniões políticas, e se encontra fora do
país da sua nacionalidade e não possa, ou em virtude daquele
receio, não queira voltar ou pedir a protecção daquele
país.
-
se não tiver nacionalidade e se achar fora do país em que
tinha a sua residência habitual, não possa ou não queira,
em face daquele receio a ele voltar;
-
devido a uma agressão externa, ocupação, dominação
estrangeira, ou acontecimento que alteram em termos graves a ordem pública
numa parte ou em todo o país de origem, seja obrigado a deixar o
lugar da sua residência habitual, com a finalidade de pedir refúgio
em outro lugar fora do país de origem ou de nacionalidade.
-
No caso da pessoa possuir mais do que uma nacionalidade, só pode
beneficiar do estatuto do Refugiado quando os motivos acima referidos se
verifiquem em relação a todos os Estados de que seja nacional.
ARTIGO 2
(Impedimento e perda do estatuto de refugiado)
-
Não pode ser considerado como refugiado ou perde essa qualidade
todo aquele que:
-
tenha praticado ou esteja indicado de ter cometido um crime contra a paz,
um crime de guerra ou um crime contra a humanidade, de acordo com a legislação
penal moçambicana ou com os instrumentos internacionais subscritos
pela República de Moçambique, quanto a previsão relativa
a tais crimes;
-
tenha praticado actos contrários aos fins e princípios das
Nações Unidas;
-
tenha voluntariamente voltado a pedir a protecção do país
da sua nacionalidade;
-
tendo perdido a sua nacionalidade, a tenha re-adquirido voluntariamente;
-
tendo adquirido uma nova nacionalidade, goze de protecção
do país de que adquiriu a nova nacionalidade;
-
tenha voltado voluntariamente a instalar-se no país que deixou ou
fora do qual ficou com receio de ser perseguido;
-
tendo deixado de existir as circunstâncias em consequência
das quais foi considerado refugiado, recusar a protecção
do país de que tenha nacionalidade.
-
Pode não ser considerado como refugiado ou perder essa qualidade
todo aquele que:
-
fora do território nacional, tenha cometido crime de delito comum
considerado grave também a luz da legislação penal
moçambicana;
-
tenha infringido os fins e os objectivos da Convenção da
O.U.A., quanto a aspectos específicos dos problemas de refugiados
em África.
ARTIGO 3
(Competência para decidir do asilo)
-
É competente para decidir sobre o pedido de asilo o Ministro do
Interior, ouvida a Comissão Consultativa para os Refugiados.
-
Da decisão do Ministro do Interior cabe recurso ao Tribunal Administrativo.
ARTIGO 4
(Extensão do estatuto de refugiado)
-
Desde que alguém seja reconhecido como refugiado, será facilitada
a entrada na República de Moçambique do membro ou membros
de seu agregado familiar, que deseja juntar-se àquele.
-
Considera-se para este efeito, como membro do agregado familiar, o cônjuge
e os filhos menores, bem como os ascendentes em primeiro grau do requerente
ou do seu cônjuge.
ARTIGO 5
(Situação jurídica do refugiado)
-
O refugiado, em princípio, goza dos direitos e tem os deveres próprios
dos estrangeiros residentes na República de Moçambique, cumprido-lhe,
fundamentalmente, respeitar e observar a legislação em vigor
no país, incluindo quaisquer instruções relativas
à manutenção da ordem pública e abster-se de
quaisquer actividades subversivas contra Estado estrangeiro.
-
O refugiado beneficiará de quaisquer direitos não aplicáveis
aos estrangeiros em geral a decorrentes da Convenção das
Nações Unidas, de 28 de Julho de 1951, do seu Protocolo Adicional,
de 31 de Janeiro de 1967 e da Convenção de O.U.A., de 10
de Setembro de 1969, salvaguardadas as reservas formuladas pela República
de Moçambique.
-
A favor do refugiado será emitido um documento de identidade comprovativo
desta sua qualidade, e um documento de viagem, quando tenha de ausentar-se
do país.
-
Os documentos a que se refere o número anterior poderão ser
recusados por razões de segurança nacional ou de ordem pública
perfilhadas pela República de Moçambique.
ARTIGO 6
(Comissão consultativa para os refugiados)
Junto do Ministério de Interior funcionará uma Comissão
Consultativa para os Refugiados.
ARTIGO 7
(Pedido do estatuto de refugiado)
Todo aquele que estiver interessado na aquisição do estatuto
de refugiado, nos termos do artigo 1, poderá requerê-lo, por
escrito ou verbalmente à competentex autoridade.
ARTIGO 8
(Autoridade competente para receber o pedido)
A autoridade normalmente competente para receber o pedido de asilo
é o Ministério do Interior através do orgão
competente de migração.
ARTIGO 9
(Residência provisória)
Será concedida uma autorização de residência
provisória, após a recepção do pedido de asilo,
a favor de requerente e das pessoas por este indicadas e nos termos do
nº. 2 do artigo 4.
ARTIGO 10
(Situação do requerente e familiares enquanto
não for concedida a autorização de residência
provisória)
-
Enquanto não for concedida a autorização de residência
provisória, procurar-se-á limitar, ao mínimo indispensável,
as deslocações do requerente e seus familiares.
-
As restrições mencionadas poderão ter lugar por ponderosas
razões de segurança nacional ou de ordem pública invocadas
pela República de Moçambique.
ARTIGO 11
(Infracções relacionadas com a entrada ilegal)
-
As infracções de natureza penal ou administrativa que porventura
tenham tido lugar e directamente relacionadas com a entrada ilegal na República
de Moçambique praticadas pelo requerente e seus familiares, e tenham
sido objecto de procedimento criminal ou procedimento administrativo, aplicar-se-á
a suspensão de qualquer destes procedimentos, a partir do momento
da apresentação do pedido.
-
Sendo a decisão favorável a concessão de asilo o procedimento
ou procedimentos levantados serão arquivados, desde que a infracção
ou infracções cometidas tivessem sido determinadas pelos
mesmos factos que justificaram a concessão do período de
asilo.
ARTIGO 12
(Naturalização)
-
A República de Moçambique poderá autorizar a aquisição
da nacionalidade moçambicana, por naturalização a
todo aquele que tenha o estatuto de refugiado, e pretenda obter, assim
aquela nacionalidade.
-
A naturalização concedida, desde que preenchidos os requisitos
da legislação sobre a nacionalidade, e as mesmas condições
que é dada a outros estrangeiros.
ARTIGO 13
(Expulsão do refugiado)
-
Um refugiado que se encontre regularmente na República de Moçambique
só pode ser expulso por razões de segurança nacional
ou de ordem pública.
-
A expulsão de um refugiados só será materializada
com base numa decisão do Ministério do Interior, desde que
esta obedeça às normas próprias do processo legal
de expulsão.
-
É permitido ao refugiado defender-se através dos meios previstos
na lei, dos factos que determinaram a expulsão, designadamente pela
apresentação de provas capazes de demonstrar a ausência
da culpa.
ARTIGO 14
(Limitação a decisão de expulsão)
-
De nenhum modo é permitido expulsar um refugiado (non refoulement)
para um território onde a sua vida, integridade física ou
a sua liberdade sejam ameaçadas por causa da sua raça, religião,
nacionalidade, filiação em determinado grupo social ou por
opiniões políticas ou devido a uma agressão externa,
ocupação, dominação estrangeira ou a acontecimento
que alteram, em termos graves, a ordem pública numa parte ou em
todo o país da origem e seja obrigado a deixar o lugar da sua residência
habitual com a finalidade de pedir refúgio em outro lugar fora do
seu país de origem ou de nacionalidade.
-
Para efeitos do número anterior deste artigo, o refugiado expulso
goza do direito de opção quanto a escolha do país
a ser enviado.
ARTIGO 15
(Proibição de envio do candidato a refugiado
para outro território)
Não é permitido o envio de candidato ao direito de asilo
para qualquer país, antes de ter lugar a decisão definitiva
sobre o pedido de asilo requerido.
ARTIGO 16
(Regulamentação)
Compete ao Conselho de Ministros proceder à regulamentação
da lei:
ARTIGO 17
(Regulamentação)
Esta lei entra imediatamente em vigor.
Aprovada pela Assembleia da República
O Presidente da Assembleia da República, Marcelino dos Santos.
Promulgada em 31 de Dezembro de 1991.
Publique-se.
O Presidente da República,
Joaquim Alberto Chissano.
* Publicada no Boletim da República,
I Série, 21. Suplemento, Nº. 52, 31 de Dezembro de 1991.