NOTA INTRODUTÓRIA

Esta publicação tem por objectivo apresentar uma recolha de trabalhos do ACNUR em Portugal, de 1995-1997, bem como textos sobre refugiados e fundamentos para um regime jurídico e social mais adequado, no interesse do Estado Português e das necessidades dos refugiados. Os trabalhos preparatórios para a avaliação da aplicação e eventual revisão da lei de asilo levaram a que muitas das recomendações constituissem os pilares para a elaboração da Proposta de Lei 97/VII de 15 de Maio de 1997, fruto de uma reflexão conjunta do Governo, ACNUR, e ONGs, especializadas nesta matéria. Os principais trabalhos preparatórios foram desenvolvidos no contexto da Reunião Internacional de Especialistas sobre o Regime Jurídico do Asilo em Portugal (Fundação Gulbenkian, 1995), da Mesa Redonda (Cruz Vermelha Portuguesa, 1995), da Audição Parlamentar sobre a Situação dos Refugiados em Portugal (Assembleia da República, 1996), das Reuniões PARinAC (Partnership in Action) e trabalhos relacionados.

O Grupo de Trabalho para a revisão da Lei de asilo, coordenado pelo Dr. Carlos Brito, em representação do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, consistiu numa experiência pioneira, uma vez que foi constituído pelo Comissário Nacional para os Refugiados (CNR), o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), o Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME) e o Conselho Português para os Refugiados (CPR), Organização Não-Governamental, desenvolvendo o seu trabalho em estreita cooperação com o ACNUR, de Março a Novembro de 1996.

Uma palavra de apreço às entidades que colaboraram em todo este trabalho e, em especial, ao então Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, Dr. Carlos Encarnação, que, desde a primeira hora, se disponibilizou para que se procedesse à revisão da lei. Tal ficou patente no seu discurso de abertura da Reunião Internacional de Especialistas, co-organizada pelo Governo Português, ACNUR e CPR, com cerca de 150 participantes, no qual reconheceu que o ambiente que envolveu a revisão da lei em 1993 ocorreu num contexto bastante diferente, com uma forte pressão migratória e novas regras de asilo mais restritivas em países da União Europeia.

A organização do Workshop sobre o Regime Jurídico do Asilo em Portugal, não teria sido possível sem o empenhamento pessoal e profissional da Doutora Maria Ioannis Baganha, bem como dos membros do Conselho Científico da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, a quem o ACNUR manifesta a sua profunda gratidão por esta iniciativa.

O discurso de abertura do Workshop do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, Dr. Luís Filipe Amado, denotando ampla visão política, sublinhou a experiência pioneira da aplicação do instituto do asilo em Portugal nos últimos anos e da constituição de um grupo de trabalho para a revisão da lei de asilo e a harmonização europeia do asilo pelo nível mais elevado das garantias, devendo o instituto de asilo ser encarado como identidade da própria civilização europeia e uma reserva da humanidade.

Foi também muito inspiradora, a palestra académica proferida pelo Doutor José Manuel Pureza, na medida em que realçou a abertura e recontextualizou a definição de refugiado, podendo esta assumir-se como uma importante peça no combate a travar entre direitos humanos e soberania dos Estados.

O Professor Mário Soares que, na altura, concluiu o seu Ciclo de Conferências, no âmbito do Curso de Relações Internacionais, no ano lectivo de 1996/97, na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, encerrou o Workshop com a primeira parte da sua Palestra. O ex-Presidente da República recordou a sua própria experiência como refugiado/exilado durante vários anos e alertou para o facto de os refugiados não serem só um fardo para quem os acolhe, temporaria ou permanentemente, mas também poderem trazer valores culturais e contribuições económicas e sociais para as sociedades onde chegam. Lembrou, ainda, o difícil debate legislativo para a revisão da lei de asilo de Agosto de 1993, que conduziu à aprovação de uma lei com várias lacunas, devido às fortes pressões políticas e migratórias existentes na altura. Congratulou-se pelo facto de actualmente a situação ser bastante diferente e, embora a Proposta de Lei de 1997 não seja perfeita, caminha no sentido de serem criadas as condições para um regime de asilo adequado.

Este Workshop veio culminar o trabalho desenvolvido pelo ACNUR em Portugal, nos últimos três anos, que deu prioridade à revisão da lei de asilo, procurando melhorar da difícil situação no que respeita às garantias legais e às condições sociais dos requerentes de asilo. Com esse objectivo procedeu-se à tradução para português de documentos sobre refugiados, e, em Janeiro de 1997, deu-se início à transferência para o CPR e para a Assistência Médica Internacional (AMI), da assistência jurídica e de emergência a casos individuais, contando já com o apoio político e financeiro do Governo, o que permite a harmonização do trabalho de refugiados em Portugal com o de outros países da União Europeia. Deste modo, o ACNUR pode concentrar-se sobretudo nos casos paradigmáticos e na realização das tarefas do seu mandato.

Assim, foram traduzidas/publicadas 7 obras em Português: Manual de Procedimentos e Critérios a Aplicar para Determinar o Estatuto de Refugiado, Estudo sobre Assuntos de Protecção na Europa Ocidental, Colectânea de Estudos e Documentação sobre Refugiados, Volumes I e II, Compilação da Audição Parlamentar sobre a Situação dos Refugiados em Portugal, A Situação dos Refugiados no Mundo: Em Busca de Soluções, bem como esta publicação sobre O Novo Regime Jurídico de Asilo em Portugal (integrando cerca de 130 documentos). Isto permitiu levar a cabo uma abordagem pró-activa, através da organização ou co-organização de 65 sessões de trabalho, onde cerca de 3000 pessoas tiveram a oportunidade de contribuir para o desenvolvimento de um amplo consenso, favorável a um novo regime de asilo em Portugal. Estas publicações foram também úteis no ensino do direito de refugiados, tanto ao nível dos advogados estagiários, através dos Cursos de Direito de Asilo na Ordem dos Advogados, como também em Palestras proferidas em Universidades Portuguesas, nomeadamente em Lisboa, Coimbra, Porto e Braga, tendo-se criado "cantinhos humanitários" nas respectivas Bibliotecas, assim como em outras entidades relevantes.

Gostaria de agradecer de forma muito especial a todas as pessoas que apoiaram estes esforços (que, por serem tantas, não as poderei mencionar individualmente), pela abertura e cooperação demonstradas para chegar a um novo regime jurídico do asilo em Portugal.

É com prazer que deixo uma menção especial de agradecimento ao trabalho desenvolvido, e à dedicação demonstrada, pelos parceiros operacionais do ACNUR, nomeadamente as equipas do Centro Regional de Segurança Social de Lisboa e Vale do Tejo, do Conselho Português para os Refugiados e da Assistência Médica Internacional.

Antes de concluir as minhas funções gostaria de deixar uma palavra de agradecimento, por toda a colaboração prestada no trabalho diário com refugiados ao Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas, Dr. José Leitão; ao Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Dr. Alberto Martins; à Relatora da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para a Revisão da Lei de Asilo, Dra. Celeste Correia; ao Deputado José Magalhães; ao Comissário Nacional para os Refugiados, Dr. Francisco de Oliveira Pires; ao Director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Dr. António Lencastre Bernardo; à Divisão de Refugiados chefiada pelo Dr. Jorge Portas (que merece uma menção especial pelo seu apoio na criação de um ambiente de confiança e cooperação com as ONGs que trabalham na área dos refugiados; ao Dr. Mário Torres, Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo; à Provedora da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Dra. Maria do Carmo Romão; ao Director da Obra Católica Portuguesa de Migrações, Padre Manuel Soares; e à Presidente da Cruz Vermelha Portuguesa, Dra. Maria Barroso, e respectivas equipas de colaboradores.

Uma palavra de reconhecimento pelo apoio à causa dos refugiados a Sua Excelência o Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio; Sua Excelência o Presidente da Assembleia da República, Dr. António Almeida Santos; Sua Excelência o Primeiro-Ministro, Eng. António Guterres; o Ministro da Presidência do Conselho de Ministros, Dr. António Vitorino; o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Dr. Jaime Gama; o Ministro da Administração Interna, Dr. Alberto Costa; o Ministro da Justiça, Dr. Vera Jardim; o Ministro da Solidariedade e da Segurança Social, Dr. Ferro Rodrigues; o Secretário de Estado para os Assuntos Europeus, Dr. Seixas da Costa; o Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, Dr. José Lamego; o Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, Dr. Luís Filipe Amado e o Secretário de Estado da Justiça, Dr. Luís Lopes da Mota.

Lisboa, 31 de Agosto de 1997
 
 
Luise Drüke (Ph. D.)
 Representante do ACNUR em Portugal 1995-9/97
 Co-Editora