As violações dos direitos humanos actuais provocam os movimentos de refugiados do futuro. Embora, nos anos 90, a maioria das deslocações de população tenha ocorrido no contexto de conflitos armados, as razões imediatas que levam as pessoas a fugir encontram-se, quase invariavelmente, ligadas a violações dos direitos humanos actuais ou antecipadas. Os refugiados abandonam as suas casas, as suas comunidades e o seu país porque receiam ser assassinados ou torturados ou ser vítimas de violação, detenção arbitrária, escravatura, assaltos e da fome.
Em reacção ao alastrar da violência e aos movimentos
de refugiados que ocorreram nos últimos anos, as Nações
Unidas, os Governos e outras instituições foram obrigados
a rever os métodos tradicionalmente utilizados para defender e promover
os direitos humanos. Apesar da questão das liberdades individuais
continuar a ser origem de controvérsia entre Governos com ideologias
e culturas diferentes, existe agora um consenso generalizado sobre a necessidade
de se encontrarem melhores formas de proteger pessoas deslocadas devido
à violência ou que se encontram sob essa ameaça. Em
resposta a estas alterações, o ACNUR e os seus parceiros
têm vindo a formular uma diversidade de estratégias que visam
evitar a necessidade das pessoas abandonarem as suas casas, bem como garantir
a segurança das populações deslocadas e permitir o
regresso dos refugiados.
Os direitos humanos e a questão dos refugiados
A questão dos direitos humanos tem ocupado um lugar proeminente
na agenda internacional desde que a Assembleia Geral das Nações
Unidas aprovou a Declaração Universal dos Direitos Humanos,
em 1948. Da mesma forma que não é possível falar de
química sem mencionar as moléculas ou de economia sem falar
na oferta e na procura, hoje em dia não é possível
falar de questões internacionais sem fazer referência aos
direitos humanos. O respeito pelos direitos humanos é agora, muito
justamente, encarado como um dos alicerces da paz, da segurança
e do desenvolvimento.
Vida, liberdade e segurança
A questão dos direitos humanos também se interliga com o problema da deslocação de populações, sendo impossível examinar uma das questões sem nos referirmos à outra. Esta ligação é concretizada de várias formas, tendo cada uma implicações importantes na procura de soluções para o problema dos refugiados.
As violações dos direitos humanos são uma causa importante - na verdade a mais importante - dos movimentos maciços de população. Esta relação fundamental nem sempre tem sido reconhecida de forma adequada. Recentemente, tornou-se um lugar comum entre políticos, meios de comunicação social e mesmo entre as organizações humanitárias, encarar as pessoas desenraízadas como vítimas do conflito armado e mesmo descrevê-las como "refugiados de guerra". Em muitos aspectos, contudo, seria mais rigoroso descrever os refugiados como pessoas cujos direitos humanos foram gravemente violados.
De acordo com a Declaração Universal Dos Direitos Humanos de 1948, todos os seres humanos têm o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Têm o direito de não serem sujeitos a tortura, a escravatura, bem como de não serem arbitrariamente forçados ao exílio, o direito de possuirem propriedade, o direito de circularem livremente no interior das fronteiras do seu país e de serem protegidos contra intromissões arbitrárias na sua vida privada e familiar.
Em muitos casos os direitos humanos são violados não apenas em função de características ou actividades individuais, mas também devido ao grupo social a que pertencem. Em resposta a este problema foi estabelecido um corpo de direito internacional, garantindo que comunidades que desejem preservar uma identidade distinta não sejam sujeitas a uma assimilação forçada, nem sejam segregadas ou discriminadas.
Por exemplo, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos
estabelece que não se deverá negar às minorias "
o direito ... à sua cultura, religião e língua".
Da mesma forma, a Convenção Internacional sobre o Genocídio
proíbe quaisquer actividades que sejam levadas a cabo com a intenção
de eliminar, total ou parcialmente, um grupo nacional, étnico, racial
ou religioso". Como demonstra a experiência recente da Ex-Jugoslávia,
é quase certa a ocorrência de deslocações maciças
de população quando os direitos reconhecidos nestes tratados
são sistematicamente ameaçados.
O direito de asilo
A concepção da protecção dos refugiados é, em si, inseparável da noção de direitos humanos. O direito de procurar e de beneficiar de asilo encontra-se inscrito na Declaração Universal Dos Direitos Humanos, enquanto a Convenção das Nações Unidas de 1951 referente ao Estatuto dos Refugiados integra o princípio fundamental de protecção, segundo o qual os Estados se devem abster de reenviar refugiados para países onde estes correriam o risco de ser perseguidos. De acordo com aquela Convenção, o objectivo último da protecção internacional é o de garantir aos refugiados os "direitos e liberdades fundamentais" que um Estado normalmente assegura aos seus cidadãos.
Infelizmente, o princípio da admissão da entrada de refugiados no território de outro país, por forma a garantir a sua segurança, sem o qual não poderá haver lugar a uma protecção eficaz, encontra-se actualmente sob crescente ameaça. Muitos países de asilo, em particular os países do mundo industrializado, parecem acusar algum cansaço em relação ao problema dos refugiados e têm vindo a estabelecer uma incrível diversidade de barreiras físicas, legais e administrativas para dificultar ou dissuadir a entrada de pessoas que pretendem pedir asilo no seu território. Cada vez mais, quer ao nível do discurso político, quer a um nível prático, os refugiados e as pessoas deslocadas são pressionados a permanecerem ou regressarem aos seus países de origem, mesmo que a situação nesses países seja insegura.
Em demasiados casos e com demasiada frequência, pessoas que conseguiram fugir a violações dos direitos humanos no seu país enfrentam novas ameaças à sua segurança no país onde procuram asilo. Embora sejam, em termos técnicos, beneficiários da protecção internacional, os refugiados podem na prática encontrar-se em constante risco de intimidação ou agressão, quer por parte de membros da comunidade de acolhimento, quer por parte dos seus próprios compatriotas. Como demonstra a recente experiência dos refugiados ruandeses no Zaire e também a anterior experiência dos refugiados do Camboja na fronteira tailandesa, um campo de refugiados pode revelar-se um dos locais mais perigosos do mundo, em particular quando é controlado por pessoas que foram, elas póprias, responsáveis por violações maciças dos direitos humanos, no seu país de origem.
As mulheres e raparigas refugiadas enfrentam problemas de protecção específicos, especialmente em situações em que as estruturas e valores sociais estabelecidos entraram em ruptura e as autoridades locais não conseguem fazer cumprir a lei nem manter a ordem. A violência e a exploração sexual constituem um grave problema que apenas recentemente começou a atrair, de forma mais sistemática, a atenção internacional (ver caixa 2.1).
Embora seja difícil generalizar, a experiência sugere que, apesar de continuarem a viver no seu país e entre os seus compatriotas, as pessoas deslocadas internamente podem correr ainda maiores riscos de violação de direitos humanos do que os refugiados.
O Perú é um exemplo pouco conhecido disso mesmo. No período entre os finais dos anos 80 e início dos anos 90, o conflito entre os guerrilheiros rebeldes e as forças de contra-inssurreição desenraízou, naquele país, cerca de 500.000 pessoas. Em muitos casos, tratava-se de camponeses pobres que tinham procurado refúgio em Lima e nos seus arredores, bem como noutros centros urbanos.
De acordo com um relatório recente do ACNUR, a situação
destas pessoas no Perú tem assumido contornos de uma "dupla
vitimação". Desapossados dos seus bens e marginalizados
no processo de deslocação, a sua capacidade de alcançar
uma vida estável, segura e produtiva tem sido limitada pela discriminação
de que são vítimas por parte dos residentes locais, pela
falta da devida documentação, bem como pelos problemas com
que se debatem para conseguir um tratamento justo por parte do sistema
judicial. Encontrando-se sobretudo nas regiões centrais do país,
bastante longe das fronteiras internacionais do Perú, relativamente
poucos se refugiaram nos países vizinhos. Apesar da difícil
situação em que se encontram, a protecção e
assistência que receberam por parte de organizações
locais e internacionais foi mínima. "A sua única alternativa"
conclui o relatório "é a de permanecerem encurralados
em zonas de conflito ou em regiões contíguas, que não
se encontram preparadas nem em termos económicos nem sociais para
os acolher"(1).
O direito de regressar
Uma outra ligação entre os direitos humanos e o problema dos refugiados pode ser observada na relação entre o repatriamento e a reintegração de populações deslocadas. O direito de regressar ao próprio país encontra-se claramente estabelecido na Declaração Universal Dos Direitos Humanos e codificado no Pacto Internacional Dos Direitos Civis e Políticos. Este último, estabelece que "ninguém pode ser arbitrariamente privado do direito de entrar no seu próprio país".
Os refugiados tendem a exercer o direito de repatriamento voluntário quando sentem que a sua segurança se encontra garantida, quer durante a viagem, quer após o seu regresso. Reconhecendo este facto, os Governos que compõem o Comité Executivo do ACNUR lançaram, em 1995, um apelo para que os programas de repatriamento "sejam levados a cabo em condições de absoluta segurança".
No entanto, mesmo após este apelo, nem sempre os refugiados têm aguardado que se encontrem estabelecidas as condições ideais, antes de regressarem às suas casas. De facto, são actualmente bastante comuns movimentos de repatriamento maciços para países que continuam a ser afectados por conflitos armados, onde continuam a verificar-se violações dos direitos humanos e onde as causas do êxodo inicial não foram completamente resolvidas.
São várias as razões que levam os refugiados a optar pelo repatriamento nestas circunstâncias tão difíceis. Por vezes, como no caso do Afeganistão, decidem regressar porque, no seu distrito ou província, foram reestabelecidos níveis aceitáveis de paz e de estabilidade, mesmo que ainda ocorram lutas violentas pelo poder na capital ou noutras regiões do país. Noutros casos, como aconteceu com meio milhão de etíopes que regressaram da Somália em 1991-92, os refugiados voltam simplesmente porque a vida no país de asilo se tornou demasiado perigosa.
Num terceiro cenário, ilustrado pelo caso dos refugiados do Myanmar
no Bangladesh, os refugiados regressam a países onde se verificaram
apenas mudanças muito limitadas, porque não podem permanecer
indefinidamente no país de asilo e porque receberam garantias relativamente
à sua segurança uma vez regressados a casa. Como este exemplo
demonstra, a negociação destas garantias com os governos
em questão e a verificação da sua implementação
constitui um dos papéis mais importantes do ACNUR na procura de
soluções (ver caixa 2.2).
Direitos económicos e sociais
A relação entre os direitos humanos e o problema da deslocação de populações, frequentemente negligenciada, pode ser observada nos esforços para responder às necessidades materiais e sociais de populações desenraizadas. Durante muitos anos, o ACNUR manteve uma clara distinção entre actividades que tinham por objectivo garantir a segurança jurídica e física dos refugiados (descritas como actividades de "protecção") e programas concebidos para prestar assistência a populações deslocadas, incluindo a distribuição de alimentos, a construção de abrigo, a prestação de cuidados médicos e a oferta de oportunidades geradoras de rendimentos (conhecidas como actividades de "assistência").Embora a organização reconhecesse a existência de uma relação entre a sua função de protecção e a tarefa mais ampla de garantir os direitos humanos, a prestação de assistência não era, em si mesma, encarada como uma actividade em favor dos direitos humanos.
Com o Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais ficou claro que os aspectos relacionados com o bem-estar material também podem ser encarados numa perspectiva de direitos humanos. Assim, o Pacto reconhece que todos os indivíduos, incluindo os refugiados e outras pessoas deslocadas, têm o direito de não passar fome, o direito à educação, ao vestuário e à habitação, bem como o direito a "um melhoramento constante das suas condições de vida". Neste sentido, os programas de reintegração e de reabilitação levados a cabo pelo ACNUR e por outras organizações humanitárias também podem ser vistas como uma forma de protecção dos direitos humanos - embora não se pretenda sugerir que a assistência material possa, em qualquer circunstância, substituir a protecção jurídica e física de que os refugiados necessitam.
Os direitos humanos são, assim, mais do que princípios
abstractos. Em certo sentido, contribuem para a prevenção
de movimentos de refugiados, limitando a acção dos Governos
e reforçando a responsabilidade dos Estados em relação
ao tratamento que conferem aos seus cidadãos. Ao mesmo tempo, contribuem
para a resolução de situações de refugiados,
fornecendo um conjunto de princípios e objectivos às actividades
operacionais levadas a cabo pelo ACNUR e pelos seus parceiros. Um dos mais
importantes desafios que a comunidade internacional actualmente enfrenta
é o de assegurar que a procura de soluções para o
problema dos refugiados seja feita de uma forma totalmente coerente com
a protecção dos direitos humanos.
Apesar da estreita ligação entre o problema dos refugiados e a protecção dos direitos humanos, a comunidade internacional manteve, até muito recentemente, uma distinção artificial entre estes dois temas. Esta distinção era, de alguma forma, uma consequência inevitável da natureza reactiva e orientada-para-o-exílio da abordagem tradicional do problema da deslocação de populações. As organizações vocacionadas para as questões dos refugiados apenas se ocupavam de uma pessoa ou de uma população quando estas tivessem fugido de um país onde a sua vida se encontrasse em risco e quando tivessem procurado asilo noutro Estado. As razões que levavam as pessoas a fugir eram consideradas uma preocupação autónoma, que não cabia no mandato humanitário e apolítico do ACNUR.
O ACNUR tinha também razões pragmáticas para minimizar a ligação entre refugiados e direitos humanos. A organização reconhecia que alguns dos países de asilo mais hospitaleiros eram, paradoxalmente, responsáveis por violações dos direitos humanos contra os seus cidadãos. Por isso, o ACNUR tinha relutância em se associar a quaisquer instituições responsáveis pela denúncia ou crítica deste tipo de abusos, uma vez que receava que tal pudesse prejudicar o bem-estar dos refugiados que se encontravam sob a sua protecção. Pela mesma razão, o ACNUR insistia que não podia ter um envolvimento activo na verificação e informação sobre a situação geral dos direitos humanos em países onde mantinha uma presença. O seu papel em qualquer país cingia-se estritamente à protecção de refugiados que tivessem fugido de outros países.
Durante a Guerra Fria, o ACNUR e outras organizações vocacionadas para os problemas dos refugiados não viam qualquer vantagem num envolvimento mais próximo com instituições de direitos humanos. Embora só os países ocidentais e os países não alinhados tivessem um interesse directo no trabalho do ACNUR, os dois blocos mais importantes tinham um interesse activo nas questões de direitos humanos e utilizavam-nos, de forma explícita, tentando desacreditar-se mutuamente. Ao conflito Leste-Oeste, acrescia a relutância de muitos países menos desenvolvidos, com regimes autoritários, em verem examinada a sua actuação em relação aos direitos humanos, colocando sérias reservas à acção e autoridade de instituições como a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas ou o Centro para os Direitos Humanos.
Para além das limitações à sua capacidade de promover ou fazer aplicar princípios de direitos humanos, as instituições de direitos humanos das Nações Unidas têm, tradicionalmente, sido bastante selectivas quanto ao seu leque de preocupações. A tortura, os "desaparecimentos", as execuções sumárias e as detenções arbitrárias eram encaradas como questões de direitos humanos e atraíam, por isso, considerável atenção. Questões relacionadas com populações desenraizadas ou afectadas pela guerra eram, contudo, geralmente vistas como problemas que cabiam no âmbito do direito internacional dos refugiados e do direito internacional humanitário, supervisionados respectivamente pelo ACNUR e pelo Comité Internacional da Cruz vermelha (CICV).
As organizações de direitos humanos têm, tradicionalmente, sido grandes defensoras das liberdades individuais e colectivas, em particular nos países mais ricos e mais pluralistas. Mas, geralmente, tem-lhes faltado o envolvimento no terreno e a orientação para situações de emergência das agências operacionais que trabalham com pessoas deslocadas, como o ACNUR, o Programa Mundial para a Alimentação e o CICV. É significativo que, os organismos de direitos humanos das Nações Unidas não tenham tido um papel substancial no planeamento das recentes operações de paz das Nações Unidas, mesmo quando estas incluíram (como no caso do Camboja e de El Salvador) estruturas e actividades de direitos humanos.
Apesar destas já antigas limitações, os organismos
de direitos humanos das Nações Unidas têm, nos últimos
anos, assumido um papel mais importante em relação, quer
às causas quer às consequências da migração
forçada. Por exemplo, em 1990 o ECOSOC autorizou a Comissão
de Direitos Humanos a convocar sessões especiais para discutir situações
urgentes de direitos humanos. Desde então, esta resolução
já foi invocada em relação ao Ruanda e à Ex-Jugoslávia.
Tal como foi referido no capítulo anterior, a Comissão tem
também, desde 1991, examinado activamente as necessidades de protecção
das pessoas deslocadas internamente. Mais recentemente, o Centro para os
Direitos Humanos e o ACNUR, iniciaram uma análise mais sistemática
do problema da apatridia, o qual tem sido até aqui negligenciado
(ver caixa 2.3).
Consenso e desacordo
Tal como os desenvolvimentos acima descritos indicam, os acontecimentos dos últimos cinco anos colocaram, de certa forma, a questão dos direitos humanos num contexto internacional mais positivo. Com o colapso do bloco de leste, as questões relativas aos direitos humanos foram, pelo menos parcialmente, despolitizadas e existe actualmente um reconhecimento crescente de que o tratamento que um Estado confere aos seus cidadãos pode ser motivo de uma legítima preocupação internacional. Tal como observou, em 1991, o antigo Secretário Geral das Nações Unidas, Javier Perez de Cuellar, a resposta internacional aos acontecimentos no Kuwait e no Iraque foi indicativa daquilo que "é provavelmente uma alteração irreversível da atitude da opinião pública, no sentido de que a defesa dos oprimidos, em nome da moralidade, deve prevalecer sobre as fronteiras".
Desde que este comentário foi produzido, tornou-se cada vez mais evidente que os Estados têm um interesse estratégico, bem como um interesse ético, na prevenção de graves violações dos direitos humanos. Mesmo Governos que sendo, eles próprios, responsáveis por violações dos direitos humanos reconhecem agora que, se quiserem evitar influxos maciços de refugiados para os seus próprios territórios, é do seu interesse limitar as violações de direitos humanos que ocorram nos países vizinhos.
Apesar destes animadores sinais de progresso, seria errado sugerir que existe actualmente um consenso universal em relação às questões de direitos humanos. Entre os membros permanentes do Conselho de Segurança - China, França, Federação Russa, EUA e Reino Unido - ainda podem ser observadas diferenças significativas relativamente a questões, internas e internacionais, de direitos humanos. Para além disso, tal como no passado, existe actualmente uma tendência entre alguns dos países menos desenvolvidos e países recém industrializados para desvalorizar as liberdades individuais, atribuindo maior relevo aos benefícios colectivos que podem ser alcançados através da estabilidade política, da ordem social e de um rápido crescimento económico.
Também seria errado dar a impressão que as tradicionais limitações dos organismos de direitos humanos das Nações Unidas desapareceram com o final da Guerra Fria. Tal como revelaram as discussões que antecederam a recente nomeação de um Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, muito países mantêm a sua oposição à verificação internacional dos direitos humanos, enquanto outros parecem estar relutantes em contribuir com meios financeiros adicionais para estas actividades. Uma prova evidente deste problema pode ser observada nos primeiros dias da crise do Ruanda, quando os mecanismos de direitos humanos das Nações Unidas foram incapazes de mobilizar o pessoal e equipamento necessários ao rápido estabelecimento de uma presença naquele país. Embora, em meados de 1995, mais de 100 observadores das Nações Unidas tivessem sido enviados para o Ruanda para verificar a situação dos direitos humanos naquele país, o programa sofria, nessa altura, de uma grave crise de financiamento.
Por isso, é necessário proteger os direitos humanos de forma mais eficaz em situações de movimentos maciços de população. Esta tarefa requer uma dupla abordagem, abrangendo por um lado, os abusos que forçam as pessoas a abandonar as suas casas e, por outro, as circunstâncias com que são confrontadas nos países de asilo. A restante parte deste capítulo examinará algumas das questões mais importantes que esta tarefa levanta. Que medidas podem ser tomadas para permitir que as pessoas possam viver em segurança no seu próprio país e na sua comunidade, ou para incentivar o repatriamento dos que já partiram? De que forma pode o asilo ser ligado, de modo mais eficaz, à procura de soluções, temporárias ou permanentes? E até que ponto será ainda relevante a tradicional solução da integração local, enquanto forma de proteger os direitos dos refugiados?