Os refugiados não têm, necessariamente, que constituir um fardo para os seus anfitriões, pelo contrário, podem contribuir de forma positiva para a economia nas regiões onde se instalam. Esta é a lição que se deve retirar de Ukwimi, na região sudeste da Zâmbia, onde se instalaram mais de 20.000 moçambicanos, durante os anos 80.
Depois de fugirem da guerra no seu país, os refugiados moçambicanos
instalaram-se, inicialmente, na região fronteiriça com a
Zâmbia. Mas depois de, tal como os seus anfitriões, terem
sido sujeitos a um conjunto de ataques transfronteiriços, por parte
de rebeldes moçambicanos, o ACNUR e o governo da Zâmbia acordaram
em estabelecer um novo acampamento de refugiados em Ukwimi, a uma distância
segura da fronteira.
A assistência internacional
A chegada dos refugiados teve um efeito galvanizador sobre Ukwimi, uma região escassamente povoada, que atravessava um período de declínio económico, desde os anos 60. Foram disponibilizados recursos substanciais de assistência internacional, muitos dos quais canalizados através do ACNUR, permitindo a construção de estradas, a criação de escolas, centros de saúde, oficinas de formação e serviços de aconselhamento agrícola. Todos estes serviços se encontravam disponíveis tanto para os moçambicanos, como para os nacionais da Zâmbia.
A construção das infra-estruturas necessárias ao funcionamento do novo acampamento de refugiados, originou a criação de centenas de postos de trabalho braçal, tanto para os refugiados, como para os zambianos, bem como um número menor de empregos junto de organizações humanitárias e de desenvolvimento, que foram atraídas para a região devido à presença dos refugiados. Em consequência, a economia local beneficiou de uma muito necessitada injecção de capital, ao mesmo tempo que aumentou a procura de bens e serviços produzidos em Ukwimi e na região circundante.
A construção de uma estrada de 65 km entre Ukwimi e a
capital de distrito, Petauke, bem como uma rede de estradas secundárias
de acesso as áreas de acampamento, tiveram um impacto particularmente
positivo sobre a actividade económica local. A melhoria das ligações
rodoviárias, tornou bastante mais fácil a comercialização
dos produtos agrícolas e artesanais, produzidos pelos refugiados
e habitantes locais. Ao mesmo tempo, o rápido aumento da população
de Ukwimi, aliado a uma melhor acessibilidade da região, fez com
que se tornasse rentável, para os comerciantes, a venda de bens
de consumo e peças para a agricultura, que anteriormente seria difícil
ou praticamente impossível comprar na localidade.
Terras aráveis
A cada família de refugiados, que se instalava em Ukwimi, era oferecida uma parcela de 2 hectares de terra arável, bem como sementes, alfaias agrícolas e um abastecimento alimentar para dois anos, altura em que era esperado que se tornassem auto-suficientes. Em 1992, a maioria das famílias moçambicanas tinha atingido este objectivo, ao passo que outras procuravam alargar a sua capacidade de produção, introduzindo a cultura do arroz e vegetais em regiões do vale conhecidas como "dambos", uma prática que os residentes locais não tardaram a imitar.
Talvez inevitavelmente, criou-se alguma concorrência, entre moçambicanos e zambianos pela utilização dos "dambos" e a utilização de recursos naturais como o bambú, canas, caça e peixe. Mas esta concorrência foi anulada pelos efeitos mutuamente benéficos das transacções realizadas entre os membros de ambas as comunidades. Os habitantes locais puderam contratar refugiados para efectuarem trabalhos agrícolas, ao passo que os moçambicanos trocavam, de livre vontade, alguns artigos humanitários, como roupa e óleo alimentar, por produtos e sementes não incluídos no seu pacote de assistência. Em resultado da revitalização económica da região, um número cada vez maior de zambianos começou a instalar-se perto de Ukwimi. Alguns eram antigos residentes que tinham abandonado a região e se tinham deslocado para um centro urbano.
O sucesso do acampamento de Ukwimi deixou, inicialmente, sem resposta uma questão importante. Agora que desfrutavam de um nível elevado de segurança física e económica, estariam os moçambicanos preparados para regressarem ao seu país, devastado por anos de conflito? A resposta dos refugiados a esta questão foi afirmativa. Tal como 1.6 milhões de compatriotas seus, os moçambicanos de Ukwimi optaram por regressar a Moçambique, logo que ficou claro que a paz tinha sido restaurada no seu país.
O movimento de repatriamento da Zâmbia, iniciou-se em 1993 e o último comboio do ACNUR partiu de Ukwimi em 1994, deixando vazio o acampamento de refugiados. Antes de partirem, muitos moçambicanos venderam os seus excedentes de milho ao Programa Mundial para a Alimentação, o que lhes permitiu comprar alguns dos artigos de que iriam necessitar para se reinstalarem em Moçambique. O acampamento foi entregue ao governo da Zâmbia, que tinha manifestado interesse em utilizar o local para acolher refugiados e requerentes de asilo provenientes de outros países, bem como para funcionários públicos reformados e outros zambianos que necessitassem de terra arável.